No dia do Trabalhador:
Aqui estão as mãos.
São os mais belos sinais da terra.
Os anjos nascem aqui:
Aqui estão as mãos.
São os mais belos sinais da terra.
Os anjos nascem aqui:
frescos, matinais, quase de
orvalho,
de coração alegre e povoado.
de coração alegre e povoado.
Ponho nelas a minha boca,
respiro o sangue, o seu rumor branco,
aqueço-as por dentro, abandonadas
nas minhas, as pequenas mãos do mundo.
respiro o sangue, o seu rumor branco,
aqueço-as por dentro, abandonadas
nas minhas, as pequenas mãos do mundo.
Alguns pensam que são as mãos de
deus
— eu sei que são as mãos de um homem,
trémulas barcaças onde a água,
a tristeza e as quatro estações
penetram, indiferentemente.
— eu sei que são as mãos de um homem,
trémulas barcaças onde a água,
a tristeza e as quatro estações
penetram, indiferentemente.
Não lhes toquem: são amor e
bondade.
Mais ainda: cheiram a madressilva.
São o primeiro homem, a primeira mulher.
E amanhece.
Mais ainda: cheiram a madressilva.
São o primeiro homem, a primeira mulher.
E amanhece.
Eugénio de Andrade, "Coração
Habitado", in Poesia / Eugénio de Andrade ; pref. José Tolentino Mendonça. - 1ª ed. - Portp : Assírio & Alvim, 2017. - 671 p. - ISBN 978-972-37-1945-1
Imagem - Leonardo da Vinci, Estudo de mãos, 1474
(No Dia do Trabalhador, as mãos são ainda um dos mais belos símbolos que ainda
permitem trazer a dignidade do trabalho, como forma de construir o quotidiano,
de o compor de beleza.)